sábado, 22 de agosto de 2009

SUGESTÃO DE ATIVIDADE SOBRE O FILME "TRANSAMERICA"

UNIVERSIDADE FEDERAL DA PARAÍBA
CENTRO DE EDUCAÇÃO/NIPAM/DHP/ DFE
Grupo de Pesquisa Currículo Transversal

Coordenação: Maria Eulina Pessoa de Carvalho e Fernando Cézar Bezerra de Andrade

Projeto PROLICEN “EM CENA: EDUCAR PARA UMA CONSCIÊNCIA DE GÊNEROS INCLUSIVA”

SUGESTÃO DE ATIVIDADE SOBRE O FILME "TRANSAMERICA"

Objetivos:
· Conhecer os estereótipos construídos social e culturalmente e suas influências em nossas percepções e reações acerca de alguém ou alguma situação;
· Perceber que existem várias diferenças entre as pessoas;
· Reconhecer que a diversidade não implica inferioridade;
· Correlacionar semelhanças e diferenças de crenças, físicas, sociais, étnicas;
. Desenvolver respeito por todas elas;


Materiais:

Breves relatos de pessoas que foram discriminadas;
Bexiga ou balões;

Procedimentos:

Discutir com os alunos sobre os estereótipos presentes na sociedade;
Colocar os relatos dentro das bexigas e distribuí-las na sala de aula;
Solicitar que os alunos formem duplas;
Cada dupla deverá pegar uma bexiga e estourar;
Convocar as duplas, uma de cada vez, para vir à frente, ler o relato que está dentro da bexiga e responder oralmente as seguintes questões:
1. Qual o impacto que este relato causou em você?
2. Que tipo de sentimentos, pensamentos e reações ele gerou?
3. Sendo você o/a personagem principal deste relato, como se sentiria diante desses fatos?
4. Em que sentido suas práticas contribuem para a manutenção ou a redução da exclusão e da discriminação?


Alguns relatos interessantes de pessoas vítimas de preconceito:

“Na balada, alguns caras desistem de ficar comigo quando vêem que eu uso um aparelho nas pernas”, relata Vanessa Bueno, jornalista. Quando era pequena e morava no interior do Paraná, ela teve pólio e, por não ter recebido o atendimento correto, possui dificuldades para andar.
• “Eu sou branca e meu pai é pardo. Na colônia onde morávamos quando eu era pequena, as crianças não queriam brincar comigo porque eu era a filha do preto. Ainda hoje, sinto uma revolta muito grande com isso.”, desabafa Juliana, veterinária de Pomerode (SC).
• “É como ter aquela sensação de que você não é bem-vindo em um espaço que é de todos”, diz Atiely Santos, rapper e videomaker de Campinas (SP) que já foi discriminada por ser negra e ter uma orientação sexual diferente das outras garotas.
• “Na última vez que estive em Salvador, um grupo de pessoas negras passou por mim e disse: Ui, branco é cor de gente doente”, conta o DJ curitibano Washington.


RELATO RELEVANTES SOBRE TRANSEXUALIDADE, TEMÁTICA ABORDADA NO FILME “TRANSAMERICA”


Relatos a respeito da procura do tratamento cirúrgico (MÁRCIA; ZAIDHAFT; MURTA, 2008, p.74).

“É porque eu não me penso neste corpo . . . Embora eu
reconheça que biologicamente sou do sexo masculino,
para mim eu não sou homem. Foi isso que me fez
procurar ajuda, eu vivia entrando em depressão . . .
Eu só quero levar a minha vida normalmente, sem
esses problemas. Ser um ser humano normal, ter os
direitos que eu não tenho.” (Roberta, 33 anos).

“Eu sinto necessidade de fazer essa cirurgia, eu estou
com um espírito montado num corpo que não é
meu, então eu não me sinto bem” (Maria, 41 anos)
.
“Eu quero fazer a cirurgia, veja bem, eu me sinto uma
supermulher. Eu não tiro meu chapéu para mulher
nenhuma. Eu sou super feliz comigo mesma, mas, na
realidade, eu tenho uma coisa que me incomoda. Me
incomoda porque não tem nada a ver comigo fisicamente,
não tem nada a ver comigo psicologicamente.”(Priscila,36anos).


Nota-se que a demanda em relação à cirurgia se constitui basicamente pelo desejo de readequação do corpo sexuado ao gênero.

Relato de intenso sofrimento psíquico

Algumas pessoas relatam uma condição de intenso sofrimento psíquico, que aparece sob a forma de tentativas de suicídio depressão, transtornos alimentares e angústia, das mais diversas formas o que é provocado não apenas pelo conflito de não pertencimento ao sexo biológico como também pelas inúmeras conseqüências sociais intrínsecas a esta condição. (MÁRCIA; ZAIDHAFT; MURTA, 2008, p ,74):


Eu já pensei em suicídio várias vezes. Eu tenho entrado
em muito desespero por causa disso [dificuldade
de arranjar emprego]. Eu acho que mesmo operando
ainda vão continuar os problemas por causa da mudança
de nome. Eu vou vivendo a minha vida, entro
em depressão, saio da depressão... eu não sei até
quando vou conseguir sair da depressão. (Roberta,
33 anos).

Isso me levou a crises de histeria . . . entrei em anorexia
. . . eu tava superdeprimida, com crise de bulimia. Eu
queria continuar vivendo com a ilusão de que de
repente ‘ah, você é um hermafrodita e vamos ter que
te operar às pressas’ . . . Já pensei até em colar [o
pênis] com superbonder. É lógico que eu não faço
porque não sou louca, mas já pensei. Já cheguei a
usar esparadrapo para prender e ficar o dia inteiro,
não podia fazer xixi. (Aline, 34 anos).

Eu me sentia revoltada porque eu não conseguia me
sentir nem uma coisa nem outra. Teve uma vez que
eu fui parar no hospital psiquiátrico . . . acho que eu
tive uma crise de identidade, eu ficava confusa com
quem eu era com quem eu não era. (Gabriela, 25 anos,
desistiu da cirurgia ao longo do tratamento).


A certeza quanto ao pertencimento ao gênero oposto, a qual às vezes se expressa pela crença numa identidade fixa se repete no cotidiano do atendimento a pacientes transexuais.

Experiência de pertencimento ao gênero feminino

É importante destacar que a experiência de pertencer ao gênero feminino ocorre desde a infância, sendo que na maioria das vezes é na adolescência que esta condição começa a ser vivida como conflito. (MÁRCIA; ZAIDHAFT; MURTA, 2008, p ,75).

. . . desde os sete anos eu já me sentia diferente dos
outros meninos. Eu nunca fui igual aos outros garotos,
eu nunca tive o mesmo comportamento, a mesma
vontade que eles. Eu sabia que era diferente . . . A
adolescência foi um caos . . . A infância até que foi
boa, mas a adolescência e sendo adulto passando
isso é um horror. (Roberta, 33 anos).

“Eu nasci uma mulher, eu só percebi que não era uma
mulher quando eu vi uma mulher pelada na minha
frente” (Priscila, 36 anos).

. . . a minha aparência já foi feminina desde criança.
Talvez não feminina, mas uma coisa meio andrógina .
. . Eu já era uma menina porque a minha mama já
estava crescendo, a minha voz nunca foi grossa,
nunca tive muita virilidade . . . Eu sempre me isolei, eu
não ia no banheiro de jeito nenhum. Quando a minha
mama começou a crescer foi um problema seriíssimo
porque eu era alvo de piadinhas, é... eu não sei se era
macho-fêmea, era um termo bem chulo. O recreio para
mim era um tormento. (Aline, 34 anos).

“Eu me olho no espelho e não me reconheço porque
eu tenho um pênis no meio das pernas” (Roberta, 33 anos).


Esta percepção de pertencimento ao gênero feminino também se dá ao longo da vida através de experiências, estilos que constituem uma forma específica de relação com o mundo e com o outro.

Sexualidades

Em geral, segundo Márcia, Zaidhaft e Murta (2008), as questões relacionadas à sexualidade ficam em segundo plano no transexualismo, o que se destaca é o desejo de obter uma identidade feminina e não necessariamente de ter relações sexuais.

“Tive contato mais íntimo de tocar, isso eu tive. Agora
de chegar ao ponto de ter relação... não. Nenhum
tipo de relação . . . O que passa na minha cabeça é
que eu não sou homossexual” (Roberta, 33 anos).

Com doze anos comecei a namorar em casa. Eu nunca
me relacionei, nem pretendo me relacionar com
uma mulher, mesmo que seja lésbica. E esse rapaz
que ficou comigo, ele não foi o tipo de cara de me
expor como um homossexual. Ele me namorava como
se eu fosse uma menina. Era normal, tinha beijo na
boca, mas não tinha esse negócio de ficar passando
a mão aqui, passando a mão lá. Eu não deixo ninguém
tocar no meu pênis de jeito nenhum, até porque
eu já não tinha ereção graças a Deus. (Priscila, 36
anos).

Quando chegou a hora [sexo] e viu que eu não era
[mulher], ficou meio assim, falou que pensava que eu
era outra coisa. Ele não continuou e terminamos o
relacionamento . . . Se eu disser que nunca tive um
relacionamento com um homossexual é mentira, eu
tive. Tive e achava que ele era homem. Quando descobri
que ele era homossexual foi horrível, aquele
caos. Transexual na cabeça desse povo não existe,
todo mundo acha que é travesti. (Priscila, 36 anos).

Eu tive um namorado por muito tempo, eu não falei
que sou transexual, que sou hermafrodita ele engoliu
na boa . . . A grande maioria não soube, mesmo tendo
relações sexuais. Eu sempre dava uma desculpa em
relação à minha genitália para não olhar, pra não tocar.
(Aline,34 anos).

Falam comigo que sou maluca porque deixei de ter
contato real para ter contato na Internet . . . Se você é
gay tem uma discriminação, quando é transexual parece
que é o dobro. Você não tem direito a nada, nada!
Você só tem obrigações, obrigação de ficar calado.
Uma vez ouvi que sou uma aberração. Eu pirei por
causa disso. Eu tinha medo de assumir para as pessoas.
(Roberta, 33 anos).


Diante do exposto, podemos observar que na maioria dos casos os transexuais preferem não ter relações sexuais por não poderem se apresentar como tais. Algumas iniciam um relacionamento e o interrompem por medo da reação do parceiro. Outras dizem que são hermafroditas ou, inicialmente, se apresentam como mulheres que “possuem um problema na genitália”. E ainda outras revelam a sua condição e constroem uma vida afetiva e sexual satisfatória.

Dificuldades profissionais

Apesar da grande dificuldade de inserção no mercado de trabalho formal, devido a problemas de documentação, a maioria delas tem uma atividade profissional.

“. . . eu nunca trabalhei de carteira assinada, só faço
bicos . . . Eles não me consideraram apta para exercer
a função por causa disso (transexualismo) sendo que
já estava tudo pronto para assinar minha carteira. Eu
fui discriminada” (Roberta, 33 anos).

“As pessoas no meu trabalho pensam que eu sou
uma mulher, não sabem da minha condição” (Aline,
34 anos).


Expectativa em relação à cirurgia de transgenitalização

De acordo com Márcia, Zaidhaft e Murta (2008), a cirurgia é considerada um processo de adequação a uma condição já existente. Apesar de ser, para algumas pessoas e para auto-realização, as pacientes não parecem ter ilusões em relação à solução de todos os seus problemas, nem mesmo uma idéia de que haveria uma mudança subjetiva. A idéia que prevalece para as que desejam realizar a cirurgia é a necessidade de se livrar de uma parte do corpo que não é reconhecido como seu.

A minha expectativa é de uma vida normal, que eu
vou conseguir ter uma vida direita. Se eu colocar
uma roupa vai ficar direita, a cirurgia vai me deixar
normal . . . Eu sei que não vou ter a sensibilidade de
uma mulher, prazer eu sei que eu não vou ter, vai ter
alguma possibilidade porque tem algumas terminações
nervosas . . . Mas meu caso não é esse, eu tô
preocupada com a feminilidade. Para mim o lugar certo
de mexer é dentro da cabeça, mas o único jeito é
mexer na parte genital. (Priscila, 36 anos).

Sentimentalmente eu acho que vai mudar muito. Eu
vou poder, eu tenho tanta vontade de ser alguém, de
me entregar a alguém de verdade. Mas eu não tenho
essa liberdade. Eu não tenho esse direito ainda . . . Eu
acho que a adequação sexual no meu caso vai ser a
cereja que falta no bolo. (Aline, 34 anos).

Eu tenho consciência de que eu nunca vou ser uma
mulher completa. Mas só de tirar [o pênis] eu já vou
me sentir mais segura diante das pessoas . . . Ser uma
mulher para mim é estar integrada na sociedade, podendo
me assumir para os outros. (Carla, 27 anos)




Observa-se, portanto, que a tansexualidade se caracteriza por uma condição de intenso sofrimento.Esta experiência se dá não apenas por uma percepção de não pertencimento ao sexo dito biológico, mas, sobretudo, pela precariedade social proveniente da não aceitação desta condição por parte da normatividade cultural vigente.Porém, se as normas de gênero são históricas e contingentes, e não essenciais ou estruturais, a postulação de um “verdadeiro sexo” ou de uma “ verdade sobre o gênero” revela antes uma ficção reguladora,uma forma de organização do social.(MÁRCIA; ZAIDHAFT; MURTA, 2008, p.73).


Referência:


MARCIA, Arán; ZAIDHAFT, Sérgio; MURTA, Daniela. Transexualidade: corpo, subjetividade e saúde coletiva. Psicol. Soc., Porto Alegre, v. 20, n. 1, abr. 2008 . Disponível em . acessos em16 ago. 2009.

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